Os forrozeiros tradicionais – aqueles que a mídia já se acostumou a chamar ‘forrozeiros raiz’ – ganharam espaço genuíno para a sua arte: a caravana de shows do São João na Rede, que neste ano assumiu o formato híbrido, com shows presenciais e transmissão online.
(Entrada do arraial junino montado pela Prefeitura de Poço de José de Moura / Fotos: Zeca Wallach)
O evento criado pela Associação Cultural Balaio Nordeste e patrocinado pelo Governo da Paraíba, foi sucesso nesse primeiro ano de shows presenciais em praças públicas de 12 pequenas e médias cidades. Esses locais foram escolhidos em parceria com a Secretaria de Estado da Cultura (SecultPB) de maneira a levar o projeto às 12 Regionais de Cultura em que a Paraíba é geograficamente representada.
O interesse demonstrado por gestores municipais em ter em suas cidades o evento e, sobretudo, o público registrado em algumas cidades para ver artistas paraibanos de forró raiz são dois fatores que projetam belo futuro para o festival, que pode sim se tornar um contraponto às festas plásticas e cheias de ritmos que nada têm a ver com a tradição junina financiadas por dinheiro público.
O Festival São João na Rede e seu formato de caravana é um movimento forte, e a presença de um caminhão palco é, ao mesmo tempo, nostálgico e excelente marketing para fixar a ideia de resistência, justamente o ambiente em que os forrozeiros e o forró tradicional têm sobrevivido há anos.
O Festival não será um antídoto ao grande equívoco administrativo e cultural em que se transformaram as festas juninas financiadas por grandes prefeituras da Paraíba, mas, com certeza será uma opção para o público que aprecia o forró pé de serra, o forró raiz e os músicos tradicionais. Também será um gerador de renda para esses artistas, que terão chance de mostrar sua arte em palco exclusivo.
Vimos e ouvimos algumas joias
O Festar esteve em seis das 12 cidades que receberam o ‘caminhão do forró’ e viu shows que poderiam ser apresentados em qualquer palco junino, pela qualidade e tipo do conteúdo, e pelo artista.
Em Pocinhos, por exemplo, vimos um rei majestoso dominar o palco como sempre fez quando ainda tínhamos o ‘Maior São do Mundo’. Biliu de Campina cantou e encantou com seu forró pesado, seus cocos e a simplicidade da arte nordestina. Antes de brilhar sobre o ‘caminhão do forró’, o rei Biliu desfilou com humildade entre o público e posou para fotos com fãs. Naquele momento, a raiz e a verdade de sua arte eram reconhecidas com sinceridade popular.
Já em Coremas, no encerramento do Festival, ocorreram dois outros shows importantes, em que Tilico do Acordeom e o Mestre Marrom entregaram apresentações magistrais. Os dois escalaram excelentes bandas e incluíram grandes sucessos do forró nos seus repertórios.
O quilombola santa-luziense Tilico tocou todos os ritmos juninos e fez uma sessão de músicas instrumentais, mostrando a famosa habilidade com a sanfona. Já Marrom, subiu ao palco acompanhado por Abdias do Acordeon, afamado sanfoneiro em Campina e redondezas.
Na etapa de Vieirópolis, presenciamos o domínio completo de Damião Moreno, levando ao público na praça pública e pela web o melhor do forró nordestino, fazendo jus às grandes apresentações do saudoso Pinto do Acordeom e do Mestre Luiz Gonzaga.
Em Poço de José de Moura, conhecemos o valor da Família Freitas, pai e filhos fazendo o fino do forró tradicional e pondo todos pra dançarem na praça pública. O grupo tem renome na região e tivemos a grata satisfação de ver e ouvir, pela primeira vez, o show dele.
Na mesma noite presenciamos momentos significativos, como foi o show de Célia Mello. Adepta de um tipo de forró com elementos mais modernos, apreciamos o respeito dessa artista que, ao ser escalada para um evento de forró raiz, não se fez de rogada e cantou todo um repertório nesse ritmo. O mesmo palco teve Chico Amaro, um forrozeiro arretado da região.
Logo na noite de abertura, em Mamanguape, a Orquestra Sanfônica Balaio Nordeste fez um show bonito, tendo em boa parte do tempo ao seu lado a competente cantora Helayne Cristini. Presença de palco, roupa de cangaceira e voz marcante, Helayne mandou um grande baile de forró no pátio do Espaço Cultural da cidade, que recepcionou o evento com fogos e bela decoração.
Em Mogeiro, o brilho ficou com a cantoria, o repente e a prosa de Jessier Quirino, A praça virou quintal aconchegante para se ouvir aqueles causos deliciosos da vida sertaneja e caririzeira. Mais uma vez, naquele momento, o São João na Rede mostrou porque é diferenciado e genuinamente forte na sua proposta de ser nordestino.
O III Festival São João na Rede teve outros shows aos quais a cobertura do Festar não esteve presente, mas que foram igualmente importantes, como o de Ananias do Acordeom, Os Fulano, Gitana Pimentel, Filhos do Forró, Forró Trakino, Bella Raiane, Luizinho Calixto, Os Anselmos, Ripa na Chulipa, entre outros.
(José Carlos dos Anjos Wallach)